Resolução 344: avanços e pontos de atenção quanto à prescrição no âmbito do Tribunal de Contas da União
Por Priscilla Pestana e Carolina Soares
Em 2022, o Tribunal de Contas da União editou a Resolução n º 344, por meio da qual estabeleceu critérios e procedimentos para o exame da prescrição, bem como os seus efeitos no processo de controle externo.
A Resolução representa um importante avanço no entendimento da aplicabilidade da prescrição nos processos correntes na Corte de Contas, substituindo o antigo entendimento de que seriam imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário público e que o exercício da pretensão punitiva encontrava limites no prazo de 10 (dez) anos, conforme previsto no art. 205 do Código Civil.
Esse entendimento foi alvo de diversos remédios constitucionais, levando o tema à apreciação do STF, que se posicionou, em diversas oportunidades (MS 32.201, MS 35.512, MS 36.067, MS 37.772, MS 38.058), pela aplicação da Lei 9.873/99, cujo art. 1º estabelece o prazo quinquenal para o exercício da pretensão punitiva pela Administração Pública:
Art. 1o Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado.
Assim, a edição da Resolução 344 pelo TCU pareceu pôr fim a um longo embate entre o TCU e o STF, uma vez que seu art. 2º dispõe expressamente que “prescrevem em cinco anos as pretensões punitiva e de ressarcimento.” É inegável que, a partir de então, o Tribunal de Contas passou a enfrentar a prescrição em seus processos e, por diversas vezes reconhecê-la (Acórdão 12604/2023- 1ª Câmara, Acórdão 12629/2023- 1ª Câmara, Acórdão 1639/2023 – Plenário). Sem dúvida, um significativo progresso para os jurisdicionados!
Por outro lado, o texto da Resolução criou outra celeuma. Agora, o problema diz respeito a data de início da fluência do prazo prescricional. Embora a Lei 9.873/99 seja clara em prescrever que o termo inicial se dará a partir “da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia que tiver cessado”, o art. 4º da Resolução prevê uma série de outros marcos iniciais, quais sejam: (i) da data em que as contas deveriam ser prestadas, em caso de omissão do gestor em fazê-lo ou (ii) da data de sua efetiva apresentação; (iii) nos casos em que o TCU receba denúncia ou representação, da data em que forem apresentadas; (iv) da data do conhecimento da irregularidade ou do dano, quando vierem a ser constatados em ação de fiscalização de qualquer órgão de controle ou (v) no caso de atividade continuada ou permanente, do momento em que cessar.
Vê-se que a Resolução inovou, ampliando o leque de hipóteses de inauguração do prazo prescricional — vale dizer, sem nenhuma base legal—, merecendo especial destaque as previstas o art. 4º, iii e iv porque subvertem a lógica prescricional, estabelecendo que o prazo se iniciará a partir da data em que for realizada a denúncia ou da data do conhecimento da irregularidade pelo Tribunal ou de qualquer órgão de controle.
Ora, se a prescrição serve à segurança jurídica das relações, limitando o tempo de inércia do órgão de controle, como pode seu prazo se iniciar quando do conhecimento da irregularidade? Em outras palavras, o que o referido inciso IV estabelece é que o prazo que o TCU dispõe para apurar eventual irregularidade se inicia quando for constatada a irregularidade. Não há nenhum sentido nisso!
Portanto, um ano após a edição da resolução, pode-se constatar que, embora sob nova roupagem jurídica, o tema ainda é controverso e permanece trazendo insegurança jurídica aos agentes públicos, sendo bem provável que, cedo ou tarde, o Supremo Tribunal Federal seja novamente instado a se pronunciar sobre a matéria.