Plataformas de negociação de débito sob a ótica da LGPD
Interessa analisar o respaldo legal, em termos de proteção de dados, quando da inclusão do nome de um devedor em uma plataforma de negociação de débitos. A ideia é compreender de que modo esse tipo de mecanismo se relaciona à Lei Geral de Proteção de Dados e como fica a negociação de dívidas prescritas no contexto da proteção à privacidade.
O primeiro ponto a se esclarecer é que as plataformas de negociação não se confundem com os tradicionais bureaus ou cadastros de restrição ao crédito porque não se propõem a “negativar” ninguém. A plataforma de negociação, na verdade, é um ambiente positivo que possibilita ao devedor incrementar sua reputação como bom pagador, merecedor de crédito, junto aos bureaus e ao mercado; isso enquanto representam um ambiente digital para a negociação e quitação de débitos com privacidade.
De fato, para assegurar a privacidade dos usuários, todo o acesso às plataformas de negociação é opcional e depende de um ato comissivo, qual seja, na criação de senha e login. Neste ambiente controlado e privado, com login exclusivo pelo titular, constarão as eventuais informações sobre os débitos vencidos e não pagos, emissão de segunda via de boletos e negociação de dívidas pretéritas. Todo o ambiente é, repise-se, restrito ao consumidor titular do CPF.
É uma característica intrínseca da plataforma de negociação, portanto, a privacidade dos dados, uma vez que somente o consumidor titular, por meio de cadastro prévio, pode visualizar as informações referentes às suas dívidas. A negociação e quitação de dívidas tornam-se mais simples, proporcionando ao interessado a oportunidade de regularizar sua situação financeira de forma descomplicada e sem constrangimento algum, porquanto todo o processo é orientado pela ação voluntária e informada do usuário.
As plataformas de negociação desempenham um papel fundamental na modernização e facilitação do processo de quitação de dívidas, ao contrário da concepção tradicional de um cadastro negativo; tendo como função principal oferecer aos consumidores um ambiente digital acessível, seguro e atualizado, proporcionando uma experiência mais transparente e eficiente.
É válido ter em mente que é indiferente, se a dívida inscrita na plataforma de negociação está ou não prescrita, porque não se trata de espaço de cobrança. É pertinente relembrar, ademais, que a prescrição afeta apenas a pretensão de cobrança judicial, não o direito em si (Artigo 189 do Código Civil). Ou seja, o débito permanece existente, e pode (até deve) ser pago já que decorreu de um serviço prestado ou produto adquirido, sendo perfeitamente factível que o devedor consciente, em circunstâncias que lhe permitam, prefira honrar com seus contratos e compromissos.
Ao incluir uma dívida inadimplida em qualquer plataforma de negociação, o fornecedor, portanto, não viola os preceitos legais, mas somente oferece um instrumento de informação e negociação à disposição do usuário, enquanto consumidor que, por sua vez, pode buscar acordos para a quitação do débito vencido em aberto.
A inclusão de informações cadastrais e pertinentes a contratos inadimplidos na plataforma de negociação encontra respaldo legal na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), que admite o tratamento de dados para diversas finalidades, sendo a execução de contrato uma delas. Repita-se que é um fato e um dado da realidade que os contratos pressupõem prestações e contraprestações, sendo escritos ou verbais, que comumente incluem o pagamento de um valor em dinheiro a título de contrapartida por algo feito ou alienado.
Assim é que quando um débito devido, prescrito ou não, é negociado, os dados pessoais que são tratados para tanto servem diretamente ao propósito de quitação contratual ou, pelo menos, de legítimo interesse com vistas ao possível adimplemento, de comum acordo, daquele contrato inadimplido entre o usuário da plataforma, consumidor, de um lado, e o fornecedor, do outro.
Referências:
IRDR 10/TJRN; AgInt no AREsp n. 1.592.662/SP; AgInt no AREsp n. 1587949/SP; REsp 1694322/SP; IRDR Proc. nº 0003543-23.2022.8.04.9000; AREsp: 2081767 RS 2022/0060810-0; Ag 1.379.761; IRDR 2026575-11.2023.8.26.0000 – TJSP; IRDR 0003543-23.2022.8.04.9000 – TJAM; Súmula nº 32 do STJ.