Os possíveis impactos que catástrofes climáticas como as enchentes do Rio Grande do Sul podem causar nos contratos de trabalho
Por Clarissa Mello da Mata
Estamos acompanhando os estragos causados pelas enchentes no Rio Grande do Sul e uma pergunta precisa ser feita: “O que acontece com os contratos de trabalho em situações como estas?”.
Os impactos de catástrofes climáticas como a que está sendo vivenciada no Rio Grande do Sul são, muitas vezes, incalculáveis. Muitas famílias perderam suas casas, seus bens, não possuem o que comer ou o que vestir. Mas também as indústrias, empresas e todo o comércio foi atingido. Algumas fábricas e estabelecimentos comerciais foram completamente atingidos pela subida do nível da água o que fez com que ficasse inviável a produção, em muitos casos, e a continuidade da prestação de serviços e das atividades comerciais. Foram perdidos em alguns casos o estoque, os insumos, máquinas danificadas, e tantos outros prejuízos que ainda nem conseguimos mensurar.
Tudo isso afeta, e muito, o mercado de trabalho como um todo. É possível que ocorram paralisações, interrupções e até mesmo encerramento de atividades de empresas que não consigam se reerguer após os prejuízos sofridos.
E como ficam os contratos de trabalhos nesta situação?
Várias são as saídas que podem ser encontradas para que os contratos de trabalho sejam preservados e para que as empresas consigam um fôlego para se reestruturar.
Uma das opções, em caso de empresas em que a atividade pode ser executada de forma remota, é realizar um aditivo ao contrato de trabalho dos empregados para que estes sejam remetidos ao regime de teletrabalho enquanto for necessário para redução de custos e para recuperação do estabelecimento físico. É importante lembrar que a CLT discorre sobre características do teletrabalho que deverão ser observadas pelo empregador e empregado também nesta hipótese. Ainda, quando as coisas voltarem ao normal ou a empresa se reestruturar, é possível, mediante novo aditivo contratual, a convocação dos empregados para retorno ao trabalho presencial, sendo necessário que sejam pré-avisados com no mínimo 15 dias antes do retorno.
Se as atividades não puderem permanecer de forma telepresencial para toda a empresa ou para determinado setor, é possível que sejam concedidas férias coletivas mediante comunicação prévia, de no mínimo 15 dias, ao Ministério do Trabalho sobre as datas de início e fim das férias e quais os setores alcançados pela medida. Norma de caráter emergencial pode dispensar o aviso prévio ao Ministério do Trabalho.
Em caso de os fatos serem considerados como força maior nos termos da lei, ou seja, fatos inevitáveis, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente, e que afetem substancialmente, ou for suscetível de afetar, em tais condições, a situação econômica e financeira da empresa, outras medidas podem ser adotadas, entre elas a redução dos salários dos empregados.
A legislação permite ao empregador, em caso de força maior, com o intuito de preservação dos contratos de trabalho, a redução salarial geral de até 25% (vinte e cinco por cento) do salário de cada empregado, respeitado sempre o salário mínimo da região. Essa medida de urgência e exceção é uma tentativa de reduzir os custos para que a empresa possa se reerguer, mas com objetivo de manter ativos os contratos de trabalho e o recebimento de salário pelos empregados que também muito precisam neste momento.
Para a redução de salários ser considerada válida, é necessária a negociação com Sindicato da categoria através de Acordo Coletivo de Trabalho. A redução pode durar por tempo indeterminado sendo que é imprevisível em quanto tempo os efeitos da força maior irão cessar.
Entretanto, cessados os efeitos decorrentes do motivo de força maior, é garantido o restabelecimento dos salários reduzidos. Para que não hajam litígios futuros, é importante que as empresas restabeleçam imediatamente os salários para o valor integral, assim que a situação econômica volte ao status anterior ao Acordo Coletivo. Sugere-se, ainda, para dar maior segurança jurídica às partes, que conste do Acordo Coletivo cláusula que resguarde a empresa e os empregados de qual critério será considerado para determinar que os efeitos da força maior cessaram para fins de restabelecimento dos salários integrais.
No caso em que a empresa atingida pela força maior tenha que encerrar suas atividades integralmente ou integral de algum de seus estabelecimentos empresariais, a legislação também permite que seja rescindido o contrato de trabalho do empregado por força maior, porém lhe é garantida indenização pela metade das verbas rescisórias devidas em caso de dispensa sem justa causa de acordo com a modalidade do contrato (prazo determinado – art. 479 da CLT ou indeterminado) em caso de empregado não estável. Em caso de empregado estável são devidas as indenizações previstas nos arts. 477 e 478 da CLT.
Em caso de extinção de um estabelecimento, somente pode ser rescindido, na forma acima, o contrato de trabalho dos empregados que estão vinculados àquele estabelecimento e não aos demais que permaneceram em atividade.
É importante que as empresas analisem qual a melhor hipótese a ser adotada, lembrando que ainda é possível que sejam adotadas mais de uma medida de forma concomitante ou sucessiva enquanto perdurar a situação de força maior.
Em caso de nenhuma dessas medidas previstas na legislação serem suficientes diante dos prejuízos sofridos pela empresa, outra medida em comum acordo com o Sindicato da categoria e com os empregados representados por comissão, podem ser negociadas de acordo com o caso concreto mediante Acordo Coletivo de Trabalho.
O mercado de trabalho como um todo sofre impactos com crises como a que estamos começando a viver no Rio Grande do Sul e além das medidas já previstas em lei é provável que sejam editadas normas emergenciais possibilitando maior flexibilidade aos empregadores, tudo no intuito de preservar a saúde financeira das empresas e os contratos de trabalho.