30 anos da Constituição: Ana Paula de Barcellos fala sobre avanços e relevância nos dias atuais
Nesse mês, a Constituição completou 30 anos desde a sua promulgação em 5 de outubro de 1988. Três décadas depois, Ana Paula de Barcellos, Professora Titular da UERJ de Direito Constitucional, fala sobre os avanços trazidos por ela, sobre a ideia de uma nova Constituição e sobre como ela se mantém relevante nos dias atuais.
Confira na entrevista a seguir:
Quais principais avanços que a Constituição de 1988 trouxe para o desenvolvimento do país?
Ana Barcellos: Na minha avaliação a Constituição trouxe dois avanços fundamentais para o país: mecanismos de organização e controle do poder político e uma carta de direitos.
Depois de 30 anos, a Constituição continua relevante? A senhora acredita que a Constituição de 1988 ainda atende às necessidades da Nação?
Ana Barcellos: Considero que a Constituição continua mais relevante do que nunca e que ela atende satisfatoriamente às necessidades do país. Isso não significa que ela não precise ser aprimorada, mas o certo é que ela mesma traz mecanismos para isso. Basta observar que muitas das previsões constitucionais ainda sequer chegaram a ser inteiramente realizadas, não porque perderam a importância, mas simplesmente porque ainda não conseguimos chegar lá: a impessoalidade e a moralidade administrativas são dois exemplos (art. 37, caput), assim como o teto remuneratório na Administração Pública (art. 37, XI), ou a educação pública de qualidade (art. 205).
Quais seriam os prós e os contras de uma nova Constituição?
Ana Barcellos: Na realidade, só vejo “contras” na ideia de uma nova Constituição no momento. É preciso lembrar que a elaboração de uma nova Constituição envolve o exercício de um poder constituinte originário: uma ruptura dramática e radical com a ordem vigente anterior. Dizemos na teoria constitucional que esse é um momento que não conta com qualquer limitação jurídica prévia, embora essa afirmação deva ser compreendida em termos, isto é: nenhuma das normas vigentes precisa ser respeitada, inclusive em relação ao que já aconteceu – tudo pode ser mudado, desfeito e refeito.
E essa ruptura se justifica pois a ideia é que o poder constituinte originário veicula a manifestação ampla, substancialmente majoritária, do povo, no sentido de um desejo de reorganizar completamente o Estado, refundar as instituições e a ordem jurídica anterior. Essa absolutamente não é a realidade brasileira, até onde posso perceber. O que há são grupos pontuais, dentro do próprio Estado, que gostariam de usar a retórica do poder constituinte originário para promover alterações específicas na ordem jurídica vigente. Para alterações pontuais existem as emendas constitucionais, que podem sempre ser aprovadas, nos termos e limites previstos pela própria Constituição.
A Constituição de 1988 é uma das mais duradouras que o Brasil já teve. Pode-se dizer que a Constituição atual é um sucesso? A que se deve essa longevidade?
Ana Barcellos: Acho que é possível dizer que a Constituição de 1988 tem sido bem sucedida em seus propósitos. Quanto a sua razoável longevidade, penso eu, decorre de ela veicular consensos básicos mas, ao mesmo tempo, ser capaz de se adaptar às novas necessidades: as dezenas de emendas que já tivemos ilustram isso.
De outro lado, é importante não desenvolver um certo fetichismo em relação à Constituição ou a qualquer norma, como se ela fosse um instrumento mágico que vai resolver todos os nossos problemas: muitas dificuldades da sociedade brasileira não serão resolvidas por meio de normas.
No geral, qual o seu olhar sobre a Constituição Federal do Brasil?
Ana Barcellos: Tenho um olhar positivo sobre a Constituição de 1988. Somos seres humanos imperfeitos e o fruto do nosso trabalho será sempre imperfeito, mas a Constituição de 1988 tem nos servido muito bem e continuará a nos servir bem, penso eu, ainda por muito tempo.