A Evolução do Plenário Virtual no Judiciário Brasileiro: Análise das Diferenças entre o STJ e o STF

Pietra Cardoso de Faria Maria Luíza Pontes Monteiro de Carvalho

O avanço tecnológico e a crescente digitalização dos processos judiciais têm impulsionado mudanças significativas no funcionamento dos tribunais brasileiros. Nesse cenário, a modernização dos julgamentos eletrônicos tornou-se uma prioridade institucional, visando aprimorar a eficiência, a transparência e a celeridade na prestação jurisdicional. Dentre os instrumentos que se destacam nesse processo está o Plenário Virtual, utilizado tanto pelo Supremo Tribunal Federal (STF) quanto pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Não obstante a semelhança estrutural entre os modelos, a comparação revela disparidades significativas no grau de amadurecimento e eficácia, sendo notórias as limitações ainda presentes no sistema virtual do STJ.

No STF, o Plenário Virtual já se consolidou como uma plataforma robusta e multifuncional. Seu uso abrange uma vasta gama de matérias, incluindo temas com repercussão geral reconhecida, ações diretas de inconstitucionalidade, arguições de descumprimento de preceito fundamental, entre outras de alta relevância. A sistemática prevista no Regimento Interno do STF (art. 323) permite que os ministros insiram seus votos eletronicamente, com prazos regimentais previamente estabelecidos, e prevê, ainda, a possibilidade de destaque para julgamento presencial por qualquer integrante da Corte. Ademais, o sistema garante publicidade e transparência, possibilitando o acompanhamento público dos votos à medida que são proferidos, em consonância com o princípio da publicidade processual, previsto no art. 93, inciso IX, da Constituição Federal.

Em contraste com o STF, o Plenário Virtual do STJ foi regulamentado originalmente em 2016, com aplicação restrita a hipóteses como embargos de declaração, agravos internos e regimentais. Apenas com a edição da Emenda Regimental nº 45, em agosto de 2024, o Tribunal promoveu uma ampla reformulação do modelo, expandindo as classes processuais passíveis de julgamento virtual, incluindo recursos especiais, agravos em recurso especial, ações rescisórias e originárias. Permanecem, contudo, excluídos os inquéritos, as ações penais, as queixas-crimes e os embargos de divergência quando houver proposta de análise do mérito recursal (e não apenas do conhecimento). A implementação do novo modelo foi concluída em fevereiro de 2025, resultando em expressivo aumento da produtividade do Tribunal.

A nova sistemática incorporou avanços em diversas etapas do procedimento decisório. Passou-se a permitir o envio de memoriais e a realização de sustentação oral em ambiente virtual, além da disponibilização gradativa dos votos à medida que são inseridos no sistema, salvo nos casos em que haja sigilo. O pedido de vista, por sua vez, passou a contar com prazos mais definidos, reforçando a previsibilidade e racionalizando a tramitação dos feitos. Tais mudanças respondem a uma demanda antiga da comunidade jurídica por maior transparência, celeridade e eficiência no julgamento dos processos.

Com efeito, no tocante à necessidade de inovações no antigo modelo, é interessante citar o fato de que o STJ recebe e julga uma quantidade superabundante de processos, sendo imperioso que soluções para essa sobrecarga sejam propostas e implementadas. Para fins elucidativos do volume de casos com os quais o Tribunal lida, na sessão de encerramento do ano forense realizada pela Corte Especial do STJ, foi divulgado o balanço estatístico do ano de 2024, que correspondeu a mais de meio milhão de processos recebidos e cerca de 677 mil decisões proferidas, o que representa mais de uma decisão por minuto. Percebe-se, então, a importância do amplo funcionamento de medidas como o novo modelo de julgamento, que trazem a expectativa de melhora na atual situação do Tribunal.

Todavia, apesar dos avanços promovidos, ainda subsistem importantes desafios no âmbito do STJ. A atuação da Corte, no ambiente virtual, continua concentrada em matérias predominantemente repetitivas ou de menor complexidade, não abrangendo, portanto, a mesma amplitude temática do sistema adotado pelo STF. Além disso, o grau de transparência do sistema do STJ ainda é inferior, não alcançando o mesmo nível de visibilidade e acesso público que se verifica no Supremo. Outro ponto crítico diz respeito ao mecanismo de destaque: no STJ, a retirada de um processo do julgamento virtual para o presencial não exige justificativa clara, o que pode comprometer a isonomia processual e a previsibilidade do procedimento.

A essas limitações somam-se preocupações práticas levantadas por juristas e ministros, especialmente quanto ao volume excessivo de processos pautados para uma mesma sessão virtual. Tal sobrecarga acarreta riscos tanto para os julgadores, que podem não dispor de tempo hábil para análise aprofundada dos autos, quanto para os advogados, que enfrentam a insegurança quanto à efetiva apreciação das sustentações orais gravadas.

Nesse sentido, destaca-se a crítica formulada pela Ministra Cármen Lúcia, do STF, acerca da ausência de publicidade imediata dos fundamentos dos votos em julgamentos virtuais. Segundo ela, a ausência de publicidade quanto aos votos viola preceitos constitucionais básicos:

“É preciso que todos os tribunais, que o Poder Judiciário brasileiro, cumpram o que a Constituição determina: os julgamentos são públicos. E julgamentos públicos não significam apenas que estamos em público, significa dar a público todos os dados, principalmente os fundamentos, porque todas as decisões têm que ser fundamentadas e o fundamento há de ser de conhecimento de todos. […] Me admira que ainda tenha um tribunal superior que não dê a público e imediatamente, para conhecimento de todos, o que é público, o que está decidindo, como está fundamentando e qual é a conclusão do julgado.” (Sessão do STF de 06/03/2024. Disponível em: https://youtu.be/v8q6XX1BzyY)

A manifestação da ministra reforça a necessidade de compatibilização entre os meios digitais e os princípios constitucionais que regem o processo jurisdicional. A publicidade, a motivação das decisões e o acesso à informação não podem ser relativizados em nome da celeridade, sob pena de se  comprometer a legitimidade do processo.

Dessa forma, conclui-se que, embora o STJ tenha promovido relevantes inovações em seu Plenário Virtual, o modelo ainda se encontra em fase de consolidação, exigindo contínuas melhorias no que diz respeito à amplitude temática, à transparência decisional e à efetividade do contraditório. A experiência do STF pode servir de paradigma, não apenas pelo grau de sofisticação da ferramenta, mas também pela forma como concilia celeridade com os princípios fundamentais do devido processo legal.

Com o intuito de facilitar a visualização das principais diferenças entre os modelos adotados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), apresenta-se a seguir um quadro comparativo que sintetiza os aspectos analisados neste artigo: 

Referências normativas e bibliográficas:

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Senado Federal, 1988.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal. Disponível em: https://www.stf.jus.br. Acesso em: abr. 2025..

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: https://www.stj.jus.br. Acesso em: abr. 2025.

SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ). Emenda Regimental nº 45, de 30 de agosto de 2024. Disponível em: https://www.stj.jus.br. Acesso em: abr. 2025.

LÚCIA, Cármen. Declaração na Sessão Plenária do STF em 06/03/2024. Disponível em: https://youtu.be/v8q6XX1BzyY. Acesso em: abr. 2025.

STJ recebe meio milhão de processos e julga mais de um por minuto. Disponível em:

<https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/2024/19122024-STJ-re cebe-meio-milhao-de-processos-e-julga-mais-de-um-por-minuto.aspx>. Acesso em: 7 abr. 2025.


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