Principais modificações nas relações contratuais com a reforma do Código Civil
Por Gabriela Reis
Em agosto de 2023, o presidente do Senado designou uma Comissão de Juristas para revisar e incluir novas disposições no Código Civil de 2002. Em 17 de abril de 2024, a comissão protocolou a minuta que, entre suas inovações, destaca as relações contratuais.
Atenta às transformações diárias, a Comissão buscou alinhar questões sociais, econômicas e culturais, refletindo as orientações da jurisprudência e da doutrina.
Prestigiaram a autonomia privada contratual, que reflete o direito dos indivíduos à autodeterminação, mas também se considerou a situação das partes hipossuficientes na relação.
Uma modificação importante refere-se aos contratos não paritários (aqueles em que não há igualdade na discussão dos termos contratuais), no qual a Comissão complementou o artigo 423 do Código Civil de 2002 com o conceito de contrato de adesão, incluindo o seguinte:
Atualmente Código Civil/2002:
“Art. 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.”
Proposta da Comissão:
“Art. 423. A expressão “contrato de adesão” engloba tanto aqueles cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente, como aqueles em que as cláusulas sejam estabelecidas unilateralmente por um dos contratantes, sem que o aderente possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.
§ 1º As cláusulas postas para adesão, no contrato escrito ou disponibilizado em espaço virtual, serão redigidas em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, de modo a facilitar a sua compreensão pelo aderente.
§ 2º Os contratos de adesão serão interpretados de maneira mais favorável ao aderente.”
Ainda, incluíram disposição específica quanto ao afastamento da legislação nos contratos civis e empresariais, identificados como simétricos e paritários, quando houver “flagrante disparidade econômica entre as partes”:
Proposta da Comissão:
“Art. 421-C…………..
§ 2º Nos contratos empresariais, quando houver flagrante disparidade econômica entre as partes, não se aplicará o disposto neste artigo.”
Por outro lado, nos contratos empresariais paritários (em que há igualdade para discussão dos termos contratuais), a nova proposta conferiu maior autonomia às partes, como a proibição de redução da cláusula penal por parte do Judiciário:
Atualmente Código Civil/2002:
“Art. 413. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.”
Proposta da Comissão:
“Art. 413. A penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz, se a obrigação principal tiver sido cumprida em parte ou se o montante da penalidade for manifestamente excessivo, tendo em vista a natureza e a finalidade do negócio.
Parágrafo único. Em contratos paritários e simétricos, o juiz não poderá reduzir o valor da cláusula penal sob o fundamento de ser manifestamente excessiva, mas as partes, contudo, podem estabelecer critérios para a redução da cláusula penal.”
Além disso, nos contratos paritários, foi concedida uma maior liberdade contratual, com especial atenção ao princípio da função social do contrato:
Atualmente Código Civil/2002:
“Art. 421. A liberdade contratual será exercida nos limites da função social do contrato. (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019)
Parágrafo único. Nas relações contratuais privadas, prevalecerão o princípio da intervenção mínima e a excepcionalidade da revisão contratual.”
Proposta da Comissão:
“Art. 421……………………………………………………………………….
§ 1° Nos contratos civis e empresariais, paritários, prevalecem o princípio da intervenção mínima e da excepcionalidade da revisão contratual.
§ 2° A cláusula contratual que violar a função social do contrato é nula de pleno direito.”
Não se olvidou, ainda, dos princípios da boa-fé contratual e da confiança, com aplicação na fase pré-contratual, contratual e pós-contratual, em casos de inadimplemento:
Atualmente Código Civil/2002:
“Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.”
Proposta da Comissão:
“Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar os princípios da probidade e da boa-fé nas tratativas iniciais, na conclusão e na execução do contrato, bem como na fase de sua eficácia pós-contratual.”
“Art. 422-A. Os princípios da confiança, da probidade e da boa-fé são de ordem pública e sua violação gera o inadimplemento contratual.”
Com essas inovações, a nova proposta da Comissão visa proporcionar maior segurança jurídica diante das atuais tendências culturais e sociais, com ênfase nas peculiaridades dos contratos paritários e não paritários, com amparo da jurisprudência, doutrina e dos princípios que regem as relações contratuais.